O Natal chegou, e com ele uma avalanche de tradições, expectativas e, muitas vezes, uma pressão silenciosa para seguir o que nos foi ensinado desde pequenos. Mas pergunto: será que as tradições devem ser mantidas a todo custo? Ou será que chegou a hora de parar, refletir e questionar o que realmente nos faz sentido?
Crescemos numa sociedade que valoriza muito a continuidade das tradições. As festas de Natal, as trocas de prendas, as reuniões familiares… Tudo isso carrega um peso simbólico e emocional enorme. A ideia de “fazer o Natal como sempre se fez” está tão enraizada nas nossas mentes que, por muito que o mundo à nossa volta mude, o Natal parece ter de seguir o mesmo guião de sempre.
Mas será que é saudável manter tradições só porque sim? Ou, mais importante ainda, será que devemos seguir algo só porque nos disseram que é importante, mesmo quando isso não faz sentido para nós?
Não quero, de forma alguma, dizer que todas as tradições são negativas ou que não têm valor. Muitas delas trazem um conforto imenso, uma sensação de pertença e continuidade. Conectam-nos às nossas raízes, às pessoas que amamos e à cultura que nos define. Para muitos, o Natal é uma época de união, de relembrar os bons momentos e criar novas memórias com os que mais amamos.
As trocas de prendas podem ser uma forma de expressar carinho, de mostrar ao outro que nos importamos. Para algumas famílias, a ceia de Natal ou as tradicionais músicas natalinas são momentos que ressoam com sentimentos profundos de alegria e de conexão. Isso é maravilhoso! E não há nada de errado em celebrar o que nos faz bem e nos traz conforto.
Porém, as tradições também têm um lado mais cinzento. E muitas vezes, o maior peso que carregamos não é o das prendas ou das festas, mas o das expectativas que nos são impostas. Expectativas de como devemos passar as festas, com quem devemos estar, o que devemos fazer, quanto devemos gastar.
E essa pressão pode ser avassaladora. O Natal acaba por se transformar numa corrida desenfreada para “fazer tudo certo”. Sentimo-nos obrigados a estar com a família, mesmo quando esse espaço não é seguro ou confortável. Sentimo-nos pressionados a dar presentes, mesmo quando as nossas finanças não permitem. Ou ainda, temos de manter a casa impecável, preparar a refeição perfeita, porque “é assim que se faz”. E o pior de tudo: muitas vezes fazemos tudo isso sem desfrutar em presença, ou sequer parar para perguntar se é isso que queremos ou se nos faz felizes.
As tradições podem acabar por se tornar uma prisão. Uma prisão da qual nos é difícil escapar, pois questionar essas normas sociais pode gerar um sentimento de culpa ou de ser “diferente”.
O verdadeiro desafio é este: questionar se as tradições que seguimos ainda fazem sentido para nós. O Natal, tal como tantas outras datas, pode ser uma época cheia de significado e propósito, mas apenas se tivermos a liberdade de vivê-la da maneira que nos faz bem.
Não temos de seguir a mesma rotina todos os anos se isso não nos traz alegria. Podemos começar novas tradições e isso pode ser libertador. Por exemplo, ao invés de passar horas a cozinhar, podemos optar por passar esse tempo a fazer algo que nos dê mais prazer, como viajar, descansar ou fazer voluntariado. Podemos deixar de lado as grandes celebrações e focar no que realmente importa: a nossa saúde mental e emocional.
E não, não precisamos de nos sentir culpados por isso. Se, para nós, a troca de prendas não é importante ou não faz sentido, podemos simplesmente não fazer. Podemos escolher o que queremos fazer, ou não fazer nada, sem que isso signifique que estamos a falhar de alguma forma. Se a nossa família não é o melhor lugar para estarmos, podemos procurar outras formas de celebração, com amigos, com colegas, ou até sozinhos, de uma maneira mais tranquila e pessoal.
O que podemos aprender, então, é que a tradição não deve ser uma camisa de forças, mas uma opção. Algo que podemos escolher conscientemente. Podemos honrar o que é tradicional, mas também podemos reinventá-lo para que faça mais sentido na nossa vida. Podemos misturar o novo e o velho, criando algo único que ressoe com a nossa verdade interior.
O Natal não precisa de ser vivido da mesma maneira por todos. Cada pessoa tem o direito de criar o seu próprio significado para a época, sem pressões ou expectativas externas.
Celebra do teu jeito e, acima de tudo, celebra com o coração em paz.